A lenda reza que Joan Crawford fez
de tudo. Esteve em contenda com Bette Davis, ganhou seu reconhecimento de
melhor atriz diante da academia, fez dublê de filme mudo, teste do sofá,
gravação de cena sem maquiagem, tricotou ignorando pessoas, debochou de atrizes
iniciantes, participou de horrores emblemáticos, bebeu e fumou tudo quanto é
filme B. “Existe outra Joan Crawford que deveríamos lembrar...” – (Bob Thomas, biográfo). Seu
trabalho virtuoso de construção de imagem permanece ainda hoje por trás da
penumbra de Mommie Dearest (1978).
Para ilustrar a importância
atribuída à Crawford em The Ultimate Movie Star, não há exemplo tão contundente
quanto o filme Os Desgraçados Não Choram (The Damned Don’t Cry, 1950),
dirigido por Vincent Sherman. Este melodrama com elementos de filme Noir conta
a história da ambiciosa Ethel Whitehead, uma coitada de inexpressiva origem
econômica, cuja perseverança de subir a hierarquia social torna-lhe a adorável
socialite Lorna Hansen Forbes. Entra agora em cena a pergunta posta como a
fórmula de Joan Crawford, ficção ou realidade?
O documentário em curta-metragem, mostrado
a seguir, reuniu [em 2005] biógrafos, críticos e acadêmicos para discutir a
semelhança dessas duas imagens. Assim como Ethel Whitehead, Lucille Fay LeSueur
veio de uma criação difícil. Lucille se via deficiente de uma figura paterna, sofreu
abusos, perdas e iniciou uma carreira cedo como dançarina, após conseguir seu
contrato de “mais-um” na MGM.
Documentário legendado em português e divulgado entre fãs brasileiros,
nosso presente de aniversário à Crawford.
Lucille transita de bico para bico
como Ethel, mas com seu trabalho de uma forte personalidade culmina na
construção da identidade crawfordiesca, uma estrela que é sempre assim no
momento que pisa fora de casa. A sofisticação, a elegância, o status de
self-made woman respondeu ao padrão americano da época com a imagem de demanda
do público. Joan Crawford pela primeira vez foi aceita socialmente.
No imaginário hollywoodiano da
ficção, a construção torna-se milhões de vezes mais ágil e rocambolesca com os
eventos da vida de uma Lorna Hansen Forbes, aliciada pela máfia, sustentada com
dinheiro de trapaças públicas, traindo tudo e todos. Ela sobe na vida, one man
at a time. O imaginário Camp supera, mas não se desfaz de sua matéria-prima, a
vida de estrelas, como Crawford, que outrora renegadas se tornam depois ícones
de comportamento e convidadas disputáveis. Existe a Joan Crawford que devemos nos
lembrar – a mãe protetora de Mildred Pierce, a guerreira de estímulos
feministas de Johnny Guitar, a descarada revolucionária de As Mulheres, a
herege brilhante de Rain, a apaixonada de Possessed, a mamãezinha querida de
Queen Bee, a idílica companheira de Daisy Kenyon. Figuras fortes e
inesquecíveis que trabalharam a feminilidade de Joan como uma pedra espessa
sendo lapidada para tornar-se preciosa. Hoje, 23 de Março, o dia em que mais um
ano se completa desde o dia que seu brilho veio ao mundo.
Este dia será celebrado com a ilustre presença de dois convidados, cuja devoção à Crawford lhes trazem a comentar aqui aspectos da carreira desta atriz tão fascinante, o símbolo definitivo de uma Self-Made Woman.
Por Leonardo Baricala
Velhos
nomes passam da moda, novas estrelinhas brilham e desaparecem, mas Joan
Crawford é a estrela que não se apaga! Ela é uma personagem lendária, a mulher
que possuiu o segredo de um glamour perpétuo. Sua carreira tornou-se a mais
longa de qualquer das estrelas de Hollywood. Por décadas representou no écran a
mulher americana! De uma criança sem pai à impassível dançarina, de corista à
estrela de cinema, Lucille LeSeur, tida também como uma das flappers originais,
por pura audácia conseguiu o que queria: vendeu por 50 anos, com singular
sucesso, o que é hoje Joan Crawford.
Quando
se tem talento, é natural tornar-se uma grande artista através de grandes papéis,
ótimos argumentos e magníficos filmes. Entretanto, é incomum o que Crawford
conseguira: impor seu talento artístico, destacar-se entre o céu estrelado da MGM,
apenas com papéis na maioria inexpressivos, argumentos fracos e sofríveis. Sim,
porque superar esses papéis de pouca valia e torna-los verdadeiros sucessos, é
ser a maior entre as melhores estrela de todos os tempos. Nem a divina Garbo,
nem mesmo a magnânima Hepburn, nem a genial Bette Davis, nem mesmo a
superprotegida Norma Shearer teriam sido grandes, sobrevivido àquelas
circunstâncias tão adversas que Joan teve que enfrentar.
Joan
não teve a sorte, por exemplo, da mulher chamada Bette Davis. Esta praticamente
começou por onde, tempos depois, ela iria chegar: importantes papéis dramáticos
em filme categorizados. Muitos dos quase 80 filmes que fez, poderiam destruir
no ato a carreira de qualquer outra atriz. Mas bastava que seu nome fizesse
parte do elenco, para que milhares de admiradores garantissem o êxito da
película.
Joan
herdou a coroa de Mary Pickford, e reinou na cidade de celuloide (E foi também
a rainha da Pepsi-Cola!). Em
certa ocasião, a Queridinha da América lhe disse: ‘Billie, minha querida, eu
estou orgulhosa do que fez de sua vida. Você não atingiu somente um objetivo,
superou-o!’
“If you’ve earned a position, be
proud of it. Don’t hide it. I want to be recognized. When I hear people say,
‘Joan Crawford!’ I turn
around and say, ‘Hi! How are you?!’”
Certas
estrelas assumiram uma importância muito maior do que qualquer filme em que
estiveram. Joan Crawford foi uma delas.
Leonardo Baricala possui 18 anos,
nascido em 26 de Julho de 1994, do signo de Leão.
Iniciará no ano corrente o curso de Letras e Linguística
da Universidade Federal de Uberlândia.
Pensa em trabalhar como tradutor,
ou até quem sabe lecionar
Língua Portuguesa nos EUA ou Europa.
Procrastinado em relação ao cinema, se interessa
pelas estrelas e por filmes bem realizados.
Por Lucas Leigh
“Gosto interpretar seres humanos que estão na sarjeta” disse Joan Crawford em entrevista ao Evening Herald em 1930, mesmo ano em que fez Paid onde interpretava Mary, uma garota que foi injustamente condenada à prisão. Dos mais de oitenta filmes que estrelou em sua longa e brilhante carreira provou que ninguém sabia melhor do que ela como dar vida a estes seres humanos, porque talvez, poucas atrizes tenham passado pelo inferno emocional que foi a sua infância e juventude: abandono, violência, abuso, pobreza, humilhações...
Mas, assim como Ethel Whitehead, sua personagem em The Damned Don’t Cry, decide sair da condição miserável que vive e fazer algo realmente importante com sua vida, sua personagem se torna Loran Forbes, uma socialite que tem um relacionamento com um dos maiores gangster americanos. Ela, a corista nascida Lucille Fay LeSueur se torna Joan Crawford que dominada por um talento inigualável, uma disciplina feroz, ambição infernal e um rosto esculpido por deuses, se torna um dos maiores e eternos ícones mundiais.
Assim como Ethel, também deu vida a Marion, uma operária que decide ir para a cidade grande e subir na vida e acaba esbarrando em um milionário que é ninguém mais, ninguém menos que Clark Gable. Seu co-astro favorito e o amor de sua vida. O filme é de 1931 e se chama Possessed e nele temos uma das mais fascinantes cenas da história do cinema. Um trem em movimento e em cada janela uma situação diferente, sonhos, ambições, amores e Marion do lado de fora que observa possuída pelo desejo de mudança, de sair da vida que julga miserável.
Também deu vida a Sadie Thompson, uma das personagens mais queridas de grandes atrizes como Tallulah Bakehead, Gloria Swanson e Jeanne Eagels. Sadie, uma mulher de alma livre que é atormentada por um missionário extremista que a obriga a cumprir uma pena de três dias rezando para se salvar se seus pecados, mas é abusada sexualmente por ele. O que nos lembra do abuso que sofreu quando criança por seu padrasto e foi mandada para uma escola católica, porque sua mãe e padrasto a culparam pelo incidente.
Também deu vida a Sadie Thompson, uma das personagens mais queridas de grandes atrizes como Tallulah Bakehead, Gloria Swanson e Jeanne Eagels. Sadie, uma mulher de alma livre que é atormentada por um missionário extremista que a obriga a cumprir uma pena de três dias rezando para se salvar se seus pecados, mas é abusada sexualmente por ele. O que nos lembra do abuso que sofreu quando criança por seu padrasto e foi mandada para uma escola católica, porque sua mãe e padrasto a culparam pelo incidente.
E em 1934, faz um de seus melhores filmes que leva o nome de sua personagem, Sadie Mckee. Filha de uma cozinheira que foge com o namorado para Nova York, mas é abandonada dias depois e se vendo sem emprego, dinheiro e esperanças, vira dançarina em uma boate. Quem conhece a história da vida de Joan Crawford mais a fundo, sabe que onze anos antes deste filme, ela era dançarina em clubes de strip e chegou bem perto de ter que se prostituir. Mas assim como na vida real, no filme, a personagem tem algo muito melhor preparado pelo destino e então vemos Sadie comemorando mais um ano de vida, comemorando ter sobrevivido e ter encontrado um novo amor. Comemorando e celebrando o início de uma nova vida. E isto, Joan também encontrou em sua nova casa, a Warner Brothes, após o término do seu contrato com a MGM, o estúdio que havia sido sua casa por 18 anos. O estúdio que lhe dava papéis abaixo de seu talento, comédia bobas e inadequadas para uma Joan madura, mas mais bela do que nunca!
Em sua nova casa, Joan fez muitos dos seus melhore filmes, começando com o icônico Mildred Pierce, interpretando brilhantemente a personagem título, uma mulher divorciada que sofre os efeitos da grande depressão e com duas filhas pra criar. Se vê cheia de dívidas e então se obriga a procurar trabalho, encontrando como garçonete. Por este filme, ganhou o seu tão merecido Oscar de Melhor Atriz.
Estrelou a personagem Harriet Craig, no filme de mesmo nome, que é mentirosa e manipula a vida de todos ao seu redor para conseguir e manter as coisas a seu gosto. Cito este filme somente porque nele, personagem e atriz tem algo em comum, a mania doentia por limpeza e organização. Mania esta que pegou quando, ainda muito jovem, trabalhou com a mãe em uma lavanderia, onde sofria os mais horríveis maus tratos, horas extenuantes de trabalho e morava nos fundos do estabelecimento. Os traumas deixados em Joan foram algo que a atormentaram pelo resto de sua vida.
Em Caminho da Redenção da vida a Davidson, uma dançarina de um circo itinerante que decide ficar em uma cidade governada por um político corrupto que vendo nela uma ameaça, torna a vida dela um verdadeiro inferno para que ela vá embora. Mas Lane não baixa a cabeça e enfrenta o político se aliando a pessoas que também estão cansadas do governador corrupto. Isto me lembra o que foi a vida de Joan, uma luta constante, muitos sofrimentos e tragédias, mas também muitas vitórias e glória eterna.
E o seu talento, beleza e glamour estão congelados no tempo e por toda a eternidade. Hoje, 23 de março, se comemora o seu aniversário e se celebra esta mulher inesquecível como poucas.
E o seu talento, beleza e glamour estão congelados no tempo e por toda a eternidade. Hoje, 23 de março, se comemora o seu aniversário e se celebra esta mulher inesquecível como poucas.
Um brinde à rainha de Hollywood!
Lucas Leigh, libriano de dezoito anos,
nasceu em 18 de outubro de 1994 e é ator.
Atualmente, estuda na Escola de Teatro NEELIC.
Pretendo fazer teatro e cinema aqui no Brasil
e quem sabe fora daqui. O que me atrai no cinema?
Bom, é a magia, algo grande e profundo demais
para se por em palavras.
Agradeço a existência de vocês por aqui.
Que Joan Crawford descanse em paz.