quinta-feira, dezembro 19, 2013

Bambi - Ela não nasceu mulher, tornou-se

Emblemática do corpo à alma, as primeiras palavras da protagonista biografada no documentário BAMBI (2013) de Sébastien Lifshitz eram sobre um sentimento de amargor inato ao seu nome de nascença Jean-Pierre. Daí, a partir de uma eficaz edição documental deste talentoso diretor francês, nós entendemos do que o filme se trata em poucos minutos. Marie-Pierre Pruvot narra a sua trajetória, nascida no dia 11 de novembro de 1935 em território argeliano ocupado pela França, ficou conhecida como uma das primeiras e mais suntuosas transexuais do mundo do espetáculo parisiense e um amuleto de sorte lhe batizaria Bambi, emblema de uma época carnavalesca que ela levaria consigo toda sua vida e mesmo depois de abandonar as artes cênicas para obter a graduação em literatura pela Sorbonne, formando-se educadora.


É notável o cuidado na pesquisa de Lifshitz pela maneira como a montagem valoriza a memória da biografada, trabalhando de forma sensível esta narrativa que se constrói em diversos níveis: a voz em off de Bambi descreve os detalhes de sua experiência enquanto indivíduo, mas temos ainda suas imagens caseiras gravadas em Super-8, as imagens do território argeliano na época e o material efetivamente produzido pelo diretor que consiste também em acompanhar a protagonista num retorno depois de anos às suas origens.


Bambi e suas colegas, no auge da noite parisiense.
(clique para ampliar a imagem)

O resultado do documentário de apenas 58 minutos constrói uma rede entre estes elementos, mostrando que é possível desfrutar ao máximo de cada um graças à união dos mesmos, falamos aqui do prazer na montagem e do olhar documental de Lifshitz. A maneira com a qual o diretor expõe as dificuldades de sua personagem com uma câmera que parece assumir o papel de um cúmplice ou de alguém a qual toda confiança do mundo foi depositada para receber aquele convidado, tratando-lhe como ilustre. A sensibilidade de Sébastien Lifshitz aponta para os dramas de seus indivíduos de maneira subjetiva, mas não desvela explicitamente a palavra dos mesmos em julgamento. Seu olhar fortalece a figura de Marie-Pierre Pruvot, alguém que precisou ser forte, símbolo de resistência e criadora da própria mulher que se tornou para poder triunfar em meio a tantas barreiras impostas socialmente.


Cabaret Carrousel de Paris, '50s e '60s.

É mesmo o momento para dar uma nova leitura ao celebre enunciado de Simone de Beauvoir, em que ela diz num contexto específico que não se nasce mulher, o ser-mulher é algo que se torna. Imaginamos, principalmente, que esta emblemática construção tenha surgido num momento em que o gênero feminino era visto não apenas com uma perspectiva negativa, mas também de maneira que inserido na sua hierarquização social o significado do feminino dependia do masculino, a figura da mulher como um segundo sexo precisava estar metaforizada à égide de sua muleta, a figura masculina.

Num ato de femininismo, Simone de Beauvoir protesta contra esta imposição social de dependência da mulher, argumentando que por natureza somos dispostos das mesmas ferramentas para alcançar e, porém, aquele ser feminino e fragilizado por regras machistas constitui uma formulação a posteriori e senão mediada pelas rédeas sociais, mas jamais pela essência. Neste caso, o ser-mulher do seu enunciado seria exatamente algo a escapar. O caso de Bambi não está muito distante, ainda que a partir de outros âmbitos da sexualidade, pois está claro que por trás da sua composição enquanto indivíduo há a vontade de uma família que espera de seu filho um casamento heterossexual. Esta mesma sociedade que lhe exige a moeda do homem bem-sucedido com promessas em troca de felicidade duradoura, também coloca as barreiras àqueles que desejam recusar o seu sistema. 

No entanto, Bambi precisou construir um ser-mulher que lhe inspirasse a ter força para resistir à estas barreiras, uma figura do feminino contrária àquela proposta por Simone de Beauvoir, pois não seria a mulher dependente. Bambi tornou-se a mulher que exigiu o que para ela era o mínimo, poder viver e para isso era preciso trabalhar. Ela queria calçar os saltos altos a qualquer custo, uma escolha mais política do que estética, Bambi nunca aceitou ser um homem ocupado a ser travesti em horas vagas, como alguns dos seus colegas cujas identidades femininas eram adereços de espetáculo, pois a si mesma, via-se diante de um espelho, a feminilidade era a sua filosofia de vida e tornar-se mulher dependia de uma invenção. No esforço de realizar o seu sonho de se tornar mulher, ela deveria necessariamente tornar isso, aceitando todas as consequências sociais implicadas pelo ato.


Marie-Pierre Pruvot, escritora e educadora, 78 anos.

Tive o prazer ontem de poder assistir a uma exibição do documentário de Lifshitz, na presença da ilustre Bambi. Inestimável a oportunidade do bate-papo com ela após a sessão. Madame Pruvot gentilmente nos acolheu com algumas curiosidades a mais sobre sua vida, contou que gravou em torno de dez horas de entrevista para o diretor parisiense. Lembrando da sua trajetória com afeto, ela dizia como era difícil a vida na Argélia e o significado de ter assistido a um espetáculo do Carrousel de Paris ainda tão jovem que lhe fez angariar as forças para ir atrás daquilo, mesmo vindo mais tarde a sentir alguns arrependimentos do trajeto percorrido nos palcos. Foi naquele momento que tudo pareceu passível à realização e as imagens de Bambi se projetaram na tela, as emoções lhe tomaram ao lembrar-se de quando era um simples garoto que sonhava com um vestido vermelho, tudo que alcançou hoje e o fim da sessão celebrava este exemplo de vida.


"Bambi et moi", le 18 décembre 2013
Foto tirada na sessão Mundo.Doc
Cinéma Opéra, merci beaucoup!

Pour devenir femme,
il faut plus qu'être née.
Un hommage à
Marie-Pierre Pruvot

sábado, setembro 28, 2013

BLUE JASMINE - Entre o sofrimento existencial e o perfume das flores, um dilema tennessiano.


PART I

Talvez até algum ponto da carreira de Woody Allen, nós poderíamos dizer que ali se mantinha uma estética com elementos constantes. Após os pontos altos e baixos nos anos 90 e na virada do século com a insistência na produção em série, o experimento em temas tão distintos acaba tornando diluída e questionável a impressão de sempre buscar na lembrança o seu personagem neurótico de amores nervosos, ainda que tenha se consagrado enquanto autor/dramaturgo. Woody Allen muda. É isto. Não é necessariamente algo negativo, diria que são fases diferentes onde o diretor aceitou estas mudanças e elas poderão ainda nos surpreender muito. BLUE JASMINE é o caso.

Os últimos filmes de Woody Allen tem variado conforme os lugares e as histórias que o diretor percorre, estes filmes nos tratam diferentemente, ainda que em comum haja a vontade de desvelar questões muito humanas. Entendendo-nos alguns como espectadores das histórias cômicas que desbravam suas risadas com a lembrança distante da eterna gargalhada de “Annie Hall” (1977), outros como sonhadores na espera de poder ver um filme cômico que motive a complexidade das questões de outrora. Hoje veremos um filme que retoma pela primeira vez a construção feminina e complexa de lugares em sua filmografia ocupados por “Husbands and Wives” (1992), “Hannah and Her Sisters” (1986) e outros de seus anos dourados.


BLUE JASMINE nos mostra a experiência de um autor que aceita a sua obra cruzada no reconhecimento daqueles que vieram antes, como Tennessee Williams. Pautando seu filme na construção sulista de um dos principais contribuintes do texto teatral americano, Woody Allen consegue brincar com duas questões de seu afã, o cruzamento entre a tragédia e a comédia, lembre-se de “Mighty Aphrodite” (1995), concebendo um trabalho fundamental para a atriz Cate Blanchett que vem de realizar no teatro uma leitura da construção do principal personagem tennessiano, Blanche DuBois.

A referência está além do explícito, desde a primeira linha do filme quando a protagonista enaltece o ex-marido e lembra de que “Blue Moon” era a música que tocava quando eles se conheceram. Em “Um Bonde Chamado Desejo” [1947], a irmã acostumada a uma vida simples e tomada pela virilidade de seu homem representa a fraqueza medíocre e a falta de refinamento, dentro da perspectiva de uma mulher perturbada pelo passado e atacada pelos nervos. Uma bela mulher que outrora conhecera a sofisticação, tagarelando “Paper Moon” ao banhar-se. E os impulsos libidinosos, nos braços de um jovem rapaz, dançando a varsouviana no Moon Lake Cassino.


ENTR'ACTE



PART II

Décadas depois, estamos agora no momento americano de Woody Allen, visitando a grande São Francisco para construir enlaces romanescos, onde grandes obras como “Vertigo” de Alfred Hitchcock foram concebidas, uma mulher interpretada como a versão contemporânea de Blanche DuBois ainda intrigará muitos espectadores com a sua hipnótica sensibilidade. Na mesma medida que a personagem da peça encontra uma experiência de provação, Jasmine se vê desafiada à desconstrução do ideal de mundo que havia em si para, então, seguir em frente após um colapso de classes sociais, representado pela sua visita à irmã. Assim como na obra tennessiana, existe uma grande discussão acerca do passado, o grande mote do cinema Noir dos anos 40 e a principal recorrência das histórias policiais consumidas na época.

O passado representa um grande fantasma que retorna para pedir as contas e, num misticismo em nível do absurdo de que o destino ostenta sob os homens um poder imperdoável, ambas as histórias colocam o fardo da multa na costa de seus principais personagens, talvez os que menos estavam preparados para suportá-lo. Lembrando uma citação de Tennessee Williams sobre a compreensão das pessoas delicadas, a razão pela qual ele teria passado todo aquele tempo sulista num quarto preparando em sua singela máquina de escrever um bonde, uma metáfora de grande desejo que atravessaria a história do teatro americano, numa homenagem, especialmente, à sua irmã que havia sofrido com doenças e cuja sensibilidade lhe movia profundamente.

(De Elia Kazan, "A streetcar named desire", 1951)

BLUE JASMINE quebra a estrutura teatral da peça de Tennessee Williams, numa tentativa de utilizar o flashback e atualizar a própria condição de narração. No entanto, este recurso já muito desgastado pelo cinema dos anos 40 e 50 não funciona hoje com a mesma agilidade, talvez uma experimentação quanto ao desvelar da história pelos diálogos seria um maior desafio.

Desafio que encontra impedimento na escolha mediana do elenco de coadjuvantes. A réplica da atuação de Marlon Brando não funciona e a própria irmã de Jasmine mostra-se insuficiente para representar um personagem tão especial e forte para a narrativa tennessianna. Uma curiosidade, na versão da adaptação para cinema realizada nos anos 90, Alec Baldwin teria feito Marlon Brando sem muito destaque e agora, ele percorre aqui os mesmos papéis de sempre. Ou seja, é inegável que tratamos aqui de um filme para a verdadeira leading actress, daqueles que tombam no elogio ao tour-de-force.




O passado Jeanette entra em colapso com o presente Jasmine, o resultado disto é o próprio termo blue em inglês que vai brilhantemente descrever, perpassando do sentido cromático para o estado psicológico, uma das grandes sensações com as quais o espectador pode sair da sala de cinema; No cruzamento de emoções de cada um, pode haver o alívio de não ser o personagem, o desespero de poder se tornar ele ou mesmo de simplesmente se identificar. Woody Allen conseguiu, como em seus principais dramas existenciais dos anos 70 e 80, retomar o fardo de memórias e sensações para um espectador em seu momento pós-fílmico, mas desta vez com um diferencial, do ator e da direção de ator enquanto principal ferramenta do fazer cinematográfico. Acompanhados por um trabalho sonoro em Blues.

FIN


domingo, junho 30, 2013

"Ne me quitte pas", Anita

Recebemos, homens e mulheres, de corpos atentos o poder de sedução de Anita, não por ser a linda garota, mas por personificar numa os diversos desejos que não conseguimos, pobres coitados, conter em nós mesmos. As representações tão plurais, construídas pelas imagens desta minissérie da Rede Globo, imortalizam nos moldes do folhetim uma ruptura da instituição do matrimônio, a traição. Há anos que a enaltecida emissora brasileira não produzia algo com tamanhas qualidades visuais e polêmicas de revirar o imaginário dos espectadores.


Para pensar o espectador tradicional de materiais específicos de ficção como este, esbarra-se num dos pés da estrutura idónea e prenhe de ideais americanos que temos como a família. Respeitada por uns, como a protagonista Lúcia Helena (Helena Ranaldi) que venera a relação com o marido e é capaz de sofrer as frustrações dele para poupa-lo, como toda heroína romântica, educada com francês, piano e etiquetas de comportamento.


Trabalhando a irresistível atmosfera de opostos, esta proposta clássica de folhetim não esquece os toques oníricos e bizarros, como a cartomante que sempre espreita os personagens. A minissérie de Manoel Carlos coloca tudo que desrespeita esta instituição familiar como indivíduos em oposição a Lúcia Helena. O título engana, Anita está sempre presente, mas de fato a história é de Lúcia Helena. Mulher que chora o tempo todo, devota aos valores do romantismo e da moralidade, representa a si própria e o contexto em que vive, onde as pessoas são frustradas com as lacunas de suas vidas e sonham com uma satisfação que promete mais do que cumpre.


É possível reconhecer o tanto que seu sofrimento é real quando se olha atentamente para as pessoas ao seu redor, são opostas. Ela é a realidade pelo olhar da narrativa, os outros se representam em fantasias com as quais a minissérie engendra o alívio ao espectador de uma melancolia latente. O único momento em que Lúcia Helena não sofre é quando acaba o último capítulo. Nos outros momentos, as fantasias tornam este “incômodo” da protagonista, configurado justamente por ver aquilo do qual não se apetece, algo menos lacrimal. Elas, as fantasias, mostram os voluptuosos exibicionismos de Anita, correspondidos pelos fascínios de um adolescente de 15 anos que sonha com ela através de uma janelinha, na mercearia da frente. Mostram o dono da mercearia, cansado da mulher velha e pouco atraente, também fascinado pela jovem. Mostram Marta (Vera Holtz), personagem irônica e racista que ao desvelar seus sentimentos preconceituosos deixa chegar à tona o seu desejo por corpos negros e musculosos. Há ainda a irmã Julieta (Carolina Kasting) que sonha com a traição do marido para poder fazer o mesmo sem culpa e, ao contrário da protagonista, traz consigo ideais modernos do grande centro urbano paulistano. A filha de Fernando Reis (José Mayer) é uma jovem também presa a ideias modernos e cosmopolitas que odeia a “roça” em que foi parar, sonhando todo tempo com shoppings e boates, até encontrar um rapaz que lhe mostre os “charmes” do bucolismo. Estas muitas fantasias são os elementos que dão significado ao contexto social da minissérie, uma narrativa que não se finda em homem mais velho e “papa anjo”.


Anita pode ser vista como uma mistura entre “Lolita” de Vladimir Nabokov e “A Cadela” de Georges de La Fouchardière, uma jovem idealizada que deixa todos desconcertados ao seu redor pela sua exuberância sexual, apresentada com uma ingenuidade infantil. Sua relação com os outros parece ser construída misticamente, ela se atenta a uma morbidez sexual que impele os outros a pensa-la como uma “pervertida”, mas parece ser ainda mais fácil perdoar suas artimanhas no momento em que ela abre seu sorriso de menina travessa. A relação da trama com a cultura francesa é poderosa, reproduz os valores clássicos de que os artistas estão à luz de Paris para aprender as artes com os mestres e de que os melhores produtos chegam de lá. Para Anita, a imagem de Armando, seu amor de longa data que só aparece por meio de memórias contadas, representa o contato com as coisas que ela admira. A música de Jacques Brel e Charles Aznavour, as ideias de Picasso, a sensualidade das danças espanholas, a boemia que lhe diverte na música “Pigalle”, cantada por Georges Ulmer.


É inevitável encontrar, ao longo da narrativa, pinceladas que exalam inspiração de cinemas psicológicos e apreciações pelo que já foi feito com elementos de surrealismo. REBECCA (1940) de Alfred Hitchcock é um filme que também trabalha a ideia de uma mulher sedutora, aventureira e principalmente admirada pelos personagens que, porém, nunca se materializa. Esta mulher é o nome do título, falecida num acidente pouco explicado, que deixa todos atordoados com a lembrança de sua existência exuberante. Em Anita, a jovem do título se muda a um apartamento em que viveu outrora uma mulher chamada Cíntia, morta pelo amante. Ambas as histórias ironizam a relação entre o amor e a morte.


Uma das últimas frases contundentes de Nando é sobre o que ele julga em Anita ser uma pulsão de morte. Ele é romancista e arquiteto de quase cinquenta anos, que cai de amores por Anita, vive o dilema de dois mundos. Do primeiro, a moralidade de sua família com filhos e o sogro problemáticos, ao segundo mundo, espaço de prazer em que só tem momentos felizes e inspirações para fazer o que lhe apetece, escrever e transar. Nando diz que Anita sempre quis morrer de amor e ele não, é possível que lhe tenha concedido um desejo de eternidade.


Anita nunca escondeu suas características peculiares, suas habilidades de ventríloqua que se orgulha de tê-las aprendido com Armando para dar vida à boneca Conchita, o prazer em morar num lugar onde alguém morreu assassinado por amor, a vontade de ser mais de uma pessoa, ser Anita, ser Cíntia e ser outras. A jovem ama ser paparicada, como a personagem de “A Cadela”, interpretada de maneira tão sensual quanto Joan Bennett, na versão da história dirigida pelo mestre do expressionismo alemão, Fritz Lang. Chamado SCARLET STREET (1945), o filme narra a história de um pintor casado que se apaixona por uma trambiqueira que já tem um amante. Ela finge amá-lo por interesse. Talvez este interesse financeiro não se explicite tanto em Anita, o que não diz que ele não existe, mas deixa espaço para que outras coisas aproximem estas duas mulheres, a tensão sexual e um desejo de amar as impossibilidades.


Ao desfecho da trama, o símbolo do fogo que explode o apartamento de Anita e a ilusão de Nando, transando para sempre com sua amada, intercala com a cena feliz de natal na fazenda. Todos os personagens cantam e regozijam de um ceia sofisticada, ainda que uma forma de velar a hipocrisia e o ódio que permeiam aquelas relações. Enquanto isso, noutro lugar - o apartamento de Anita, amor queima como ritual de sacrifício daquelas pessoas que, como em toda boa moralidade folhetinesca, precisam pagar pelo que cometeram.


Seria também interessante se a loucura do Nando perdurasse como símbolo de uma eterna autopunição, o guardar secretamente do assassinato cometido. Isso talvez lhe estimulasse um suicídio, como é o caso do gênio Edward G. Robinson pela personagem de Joan Bennett, no filme de Lang, intitulado aqui no Brasil como “Almas Perversas”. A sequência intercalada de cenas tão diferentes, ligadas apenas pela mesma sonoridade trabalha um conceito de execução muito comum no cinema, desde Nosferatu (1922) de F. W. Murnau. É uma onisciência da narrativa ao espectador que se aproxima de uma experiência de divindade, é o saber de todas as coisas.



Anita jamais poderia envelhecer, há risco demais para deixar de ser atraente, de ter que encarar a realidade, de não poder mais atrair os olhares dos outros com tantas facilidades. É mais conveniente para a personagem manter-se intacta em sua idealização do amor e do erotismo. Depois de acompanhar suas peripécias, chega-se a conclusão de que se forma aqui uma metalinguagem pela repetição da música “Ne me quitte pas” de Jacques Brel, interpretada com a pungência de Maysa. É como se a própria música nos pedisse para não deixa-la e obedecemos ainda por muitos dias, antes de tirar ela(s) de nossa cabeça.


Un petit jet d'eau
Une station de métro
Entourée de bistrots
Pigalle
Grands magasins
Ateliers de rapins
Restaurants pour rupins
PIGALLE!

sexta-feira, abril 05, 2013

DAVIS - Construção de um mito


Jamais alguém esquecerá que o olhar mais cinematográfico já tem dono. Bette Davis atrai os olhares de espectadores desde quando ainda era Ruth Elizabeth Davis e pegou fogo por acidente em sala de aula. Todos olhavam sua estripulia e davam-lhe toda a atenção do mundo. Davis mais tarde comentou que a tragédia teve significado de glória para ela que jamais se sentiu daquele jeito e simplesmente amou ser o centro das atenções. Bette Davis não precisa viver hoje para ainda ser lembrada e ter sua memória celebrada, o mito Bette Davis Eyes foi tão bem construído que uma diva como ela tende a permanecer maior que a vida por muito tempo.

Talvez tenha sido Escravos do Desejo (Of Human Bondage, 1934) em que a jovem Davis armou as garras pela primeira vez, destilando com olhos enormes, sua marca registrada, e palavras ferinas, o veneno de Mildred. O humilhado personagem de Leslie Howard sai curiosamente ainda mais fascinado por ela. Depois disso, Davis cultivou a imagem de víbora que lhe rendeu Oscar em Perigosa (Dangerous, 1935) e muitos fãs. O exemplo mais emblemático de suas marcas de maldade há de ser Pérfida (The Little Foxes, 1941). Uma extraordinária pérola de William Wyler que permanece incendiando nossas mentes por não matar a protagonista, uma verdadeira cobra enviada quase de profecias bíblicas que assiste, como numa montagem mitológica grega, ao corpo do marido morrendo e triunfantemente se regozija disso. Posteriormente, Bette Davis recordaria a parceria com Wyler num filme que considero o topo do melhor de suas interpretações, como uma mulher que não é heroína e não é víbora. É simplesmente uma mulher que fracassou, cedendo suas energias a desejos e expectativas de vida que não seriam correspondidas. O resultado disso é obviamente morte. Foi A Carta (The Letter, 1940) o filme de Davis que tinha o oriente como pano de fundo para sua história de traição e paixão descobertas. Infelizmente, sua narrativa fantástica e muitíssimo bem filmada por Wyler não ludibriou os censores, a punição do final foi imposta a Wyler, pois o público da época não dava conta da fascinante e maneirada interpretação de Davis a uma adúltera que mata e engana a instituição judiciária só para o maridinho acreditar nas suas virtudes de bondades, enquanto morre de tricotar, dentro e fora dos bastidores, aos acordes de Max Steiner. Apesar de perder a força com o tom de moralidade, a obra permanece possuidora de uma das melhores concepções enredísticas e é exaltado com o máximo de beleza de detalhes, diálogos, figurinos, engendramentos, personagens e elementos de narrativa.

Outras mulheres de Davis foram também assim, desgraçadas pelas vidas que levavam e envenenadas por se deixar ter demasiada paixão ou ganância. Mulheres que terminaram caídas na lamúria ou mortas em acidentes de carro. Assim como o poder que configurava todas estas personagens, por outro lado, as heroínas de Bette Davis ganhavam cada vez mais espaço com filmes como
A Estranha Passageira (Now, Voyager, 1942). Davis cede pelo homem que ama, cuida dos seres ao seu redor como a si mesma e é capaz de se transformar por completo para outra pessoa. A vida pessoal de Davis inevitavelmente se modificou como o patinho feio do filme se tornou cisne. Davis sempre foi ciente de que não ocupava o palco do padrão estético, mas evidentemente soube construir sua imagem. Ela não precisa ter a feição ingênua de Vivien Leigh ou o carão simetricamente perfeito de Garbo para ser bela, Davis tinha uma carta nas mangas, ela sabia nos fazer crer que era magnífica. Até em seus filmes de maior trabalho Camp dentro de um gênero exagerado que ficou conhecido como Grand Dame Guignol, histórias de velhas problemáticas que outrora foram celebridades, mas caíram no esquecimento, de velhas reclusas enfrentando dificuldade para se encontrar socialmente, de velhas que tem nostalgia por sentimentos de desejo carnal, Davis nos fazia piamente crer na beleza de seus personagens. Ao fim da carreira, quando se dedicou a filmes para TV, uma versão extremamente madura de si aparece contracenando com as novas gerações, como em Difícil Reencontro (Strangers: The Story of a Mother and Daughter, 1979) e demonstra uma lucidez das coisas incrível. A tendência é que cada vez menos pessoas se enganem que Davis era malvada em A Malvada (All About Eve, 1950), com a maior disseminação de seus filmes na rede. Compartilhar é definitivamente a melhor forma de manter em nós a sua memória viva.

She's everything a woman can dare to be.
This is the century of Bette Davis.


sábado, março 23, 2013

A Tribute to Joan Crawford's Birthdate



A lenda reza que Joan Crawford fez de tudo. Esteve em contenda com Bette Davis, ganhou seu reconhecimento de melhor atriz diante da academia, fez dublê de filme mudo, teste do sofá, gravação de cena sem maquiagem, tricotou ignorando pessoas, debochou de atrizes iniciantes, participou de horrores emblemáticos, bebeu e fumou tudo quanto é filme B. “Existe outra Joan Crawford que deveríamos lembrar...” – (Bob Thomas, biográfo). Seu trabalho virtuoso de construção de imagem permanece ainda hoje por trás da penumbra de Mommie Dearest (1978).

Para ilustrar a importância atribuída à Crawford em The Ultimate Movie Star, não há exemplo tão contundente quanto o filme Os Desgraçados Não Choram (The Damned Don’t Cry, 1950), dirigido por Vincent Sherman. Este melodrama com elementos de filme Noir conta a história da ambiciosa Ethel Whitehead, uma coitada de inexpressiva origem econômica, cuja perseverança de subir a hierarquia social torna-lhe a adorável socialite Lorna Hansen Forbes. Entra agora em cena a pergunta posta como a fórmula de Joan Crawford, ficção ou realidade?

O documentário em curta-metragem, mostrado a seguir, reuniu [em 2005] biógrafos, críticos e acadêmicos para discutir a semelhança dessas duas imagens. Assim como Ethel Whitehead, Lucille Fay LeSueur veio de uma criação difícil. Lucille se via deficiente de uma figura paterna, sofreu abusos, perdas e iniciou uma carreira cedo como dançarina, após conseguir seu contrato de “mais-um” na MGM.

Documentário legendado em português e divulgado entre fãs brasileiros,
nosso presente de aniversário à Crawford.

Lucille transita de bico para bico como Ethel, mas com seu trabalho de uma forte personalidade culmina na construção da identidade crawfordiesca, uma estrela que é sempre assim no momento que pisa fora de casa. A sofisticação, a elegância, o status de self-made woman respondeu ao padrão americano da época com a imagem de demanda do público. Joan Crawford pela primeira vez foi aceita socialmente.

No imaginário hollywoodiano da ficção, a construção torna-se milhões de vezes mais ágil e rocambolesca com os eventos da vida de uma Lorna Hansen Forbes, aliciada pela máfia, sustentada com dinheiro de trapaças públicas, traindo tudo e todos. Ela sobe na vida, one man at a time. O imaginário Camp supera, mas não se desfaz de sua matéria-prima, a vida de estrelas, como Crawford, que outrora renegadas se tornam depois ícones de comportamento e convidadas disputáveis. Existe a Joan Crawford que devemos nos lembrar – a mãe protetora de Mildred Pierce, a guerreira de estímulos feministas de Johnny Guitar, a descarada revolucionária de As Mulheres, a herege brilhante de Rain, a apaixonada de Possessed, a mamãezinha querida de Queen Bee, a idílica companheira de Daisy Kenyon. Figuras fortes e inesquecíveis que trabalharam a feminilidade de Joan como uma pedra espessa sendo lapidada para tornar-se preciosa. Hoje, 23 de Março, o dia em que mais um ano se completa desde o dia que seu brilho veio ao mundo.


Este dia será celebrado com a ilustre presença de dois convidados, cuja devoção à Crawford lhes trazem a comentar aqui aspectos da carreira desta atriz tão fascinante, o símbolo definitivo de uma Self-Made Woman.





Por Leonardo Baricala

Velhos nomes passam da moda, novas estrelinhas brilham e desaparecem, mas Joan Crawford é a estrela que não se apaga! Ela é uma personagem lendária, a mulher que possuiu o segredo de um glamour perpétuo. Sua carreira tornou-se a mais longa de qualquer das estrelas de Hollywood. Por décadas representou no écran a mulher americana! De uma criança sem pai à impassível dançarina, de corista à estrela de cinema, Lucille LeSeur, tida também como uma das flappers originais, por pura audácia conseguiu o que queria: vendeu por 50 anos, com singular sucesso, o que é hoje Joan Crawford.

Quando se tem talento, é natural tornar-se uma grande artista através de grandes papéis, ótimos argumentos e magníficos filmes. Entretanto, é incomum o que Crawford conseguira: impor seu talento artístico, destacar-se entre o céu estrelado da MGM, apenas com papéis na maioria inexpressivos, argumentos fracos e sofríveis. Sim, porque superar esses papéis de pouca valia e torna-los verdadeiros sucessos, é ser a maior entre as melhores estrela de todos os tempos. Nem a divina Garbo, nem mesmo a magnânima Hepburn, nem a genial Bette Davis, nem mesmo a superprotegida Norma Shearer teriam sido grandes, sobrevivido àquelas circunstâncias tão adversas que Joan teve que enfrentar.

Joan não teve a sorte, por exemplo, da mulher chamada Bette Davis. Esta praticamente começou por onde, tempos depois, ela iria chegar: importantes papéis dramáticos em filme categorizados. Muitos dos quase 80 filmes que fez, poderiam destruir no ato a carreira de qualquer outra atriz. Mas bastava que seu nome fizesse parte do elenco, para que milhares de admiradores garantissem o êxito da película.

Joan herdou a coroa de Mary Pickford, e reinou na cidade de celuloide (E foi também a rainha da Pepsi-Cola!). Em certa ocasião, a Queridinha da América lhe disse: ‘Billie, minha querida, eu estou orgulhosa do que fez de sua vida. Você não atingiu somente um objetivo, superou-o!’

“If you’ve earned a position, be proud of it. Don’t hide it. I want to be recognized. When I hear people say, ‘Joan Crawford!’ I turn around and say, ‘Hi! How are you?!’”

Certas estrelas assumiram uma importância muito maior do que qualquer filme em que estiveram. Joan Crawford foi uma delas.



Leonardo Baricala possui 18 anos,
nascido em 26 de Julho de 1994, do signo de Leão.
Iniciará no ano corrente o curso de Letras e Linguística
da Universidade Federal de Uberlândia.
Pensa em trabalhar como tradutor,
ou até quem sabe lecionar
Língua Portuguesa nos EUA ou Europa.
Procrastinado em relação ao cinema, se interessa
pelas estrelas e por filmes bem realizados.

Por Lucas Leigh 

“Gosto interpretar seres humanos que estão na sarjeta” disse Joan Crawford em entrevista ao Evening Herald em 1930, mesmo ano em que fez Paid onde interpretava Mary, uma garota que foi injustamente condenada à prisão. Dos mais de oitenta filmes que estrelou em sua longa e brilhante carreira provou que ninguém sabia melhor do que ela como dar vida a estes seres humanos, porque talvez, poucas atrizes tenham passado pelo inferno emocional que foi a sua infância e juventude: abandono, violência, abuso, pobreza, humilhações... 

Mas, assim como Ethel Whitehead, sua personagem em The Damned Don’t Cry, decide sair da condição miserável que vive e fazer algo realmente importante com sua vida, sua personagem se torna Loran Forbes, uma socialite que tem um relacionamento com um dos maiores gangster americanos. Ela, a corista nascida Lucille Fay LeSueur se torna Joan Crawford que dominada por um talento inigualável, uma disciplina feroz, ambição infernal e um rosto esculpido por deuses, se torna um dos maiores e eternos ícones mundiais. 

Assim como Ethel, também deu vida a Marion, uma operária que decide ir para a cidade grande e subir na vida e acaba esbarrando em um milionário que é ninguém mais, ninguém menos que Clark Gable. Seu co-astro favorito e o amor de sua vida. O filme é de 1931 e se chama Possessed e nele temos uma das mais fascinantes cenas da história do cinema. Um trem em movimento e em cada janela uma situação diferente, sonhos, ambições, amores e Marion do lado de fora que observa possuída pelo desejo de mudança, de sair da vida que julga miserável.

Também deu vida a Sadie Thompson, uma das personagens mais queridas de grandes atrizes como Tallulah Bakehead, Gloria Swanson e Jeanne Eagels. Sadie, uma mulher de alma livre que é atormentada por um missionário extremista que a obriga a cumprir uma pena de três dias rezando para se salvar se seus pecados, mas é abusada sexualmente por ele. O que nos lembra do abuso que sofreu quando criança por seu padrasto e foi mandada para uma escola católica, porque sua mãe e padrasto a culparam pelo incidente. 


E em 1934, faz um de seus melhores filmes que leva o nome de sua personagem, Sadie Mckee. Filha de uma cozinheira que foge com o namorado para Nova York, mas é abandonada dias depois e se vendo sem emprego, dinheiro e esperanças, vira dançarina em uma boate. Quem conhece a história da vida de Joan Crawford mais a fundo, sabe que onze anos antes deste filme, ela era dançarina em clubes de strip e chegou bem perto de ter que se prostituir. Mas assim como na vida real, no filme, a personagem tem algo muito melhor preparado pelo destino e então vemos Sadie comemorando mais um ano de vida, comemorando ter sobrevivido e ter encontrado um novo amor. Comemorando e celebrando o início de uma nova vida. E isto, Joan também encontrou em sua nova casa, a Warner Brothes, após o término do seu contrato com a MGM, o estúdio que havia sido sua casa por 18 anos. O estúdio que lhe dava papéis abaixo de seu talento, comédia bobas e inadequadas para uma Joan madura, mas mais bela do que nunca! 

Em sua nova casa, Joan fez muitos dos seus melhore filmes, começando com o icônico Mildred Pierce, interpretando brilhantemente a personagem título, uma mulher divorciada que sofre os efeitos da grande depressão e com duas filhas pra criar. Se vê cheia de dívidas e então se obriga a procurar trabalho, encontrando como garçonete. Por este filme, ganhou o seu tão merecido Oscar de Melhor Atriz. 

Estrelou a personagem Harriet Craig, no filme de mesmo nome, que é mentirosa e manipula a vida de todos ao seu redor para conseguir e manter as coisas a seu gosto. Cito este filme somente porque nele, personagem e atriz tem algo em comum, a mania doentia por limpeza e organização. Mania esta que pegou quando, ainda muito jovem, trabalhou com a mãe em uma lavanderia, onde sofria os mais horríveis maus tratos, horas extenuantes de trabalho e morava nos fundos do estabelecimento. Os traumas deixados em Joan foram algo que a atormentaram pelo resto de sua vida. 

Em Caminho da Redenção da vida a Davidson, uma dançarina de um circo itinerante que decide ficar em uma cidade governada por um político corrupto que vendo nela uma ameaça, torna a vida dela um verdadeiro inferno para que ela vá embora. Mas Lane não baixa a cabeça e enfrenta o político se aliando a pessoas que também estão cansadas do governador corrupto. Isto me lembra o que foi a vida de Joan, uma luta constante, muitos sofrimentos e tragédias, mas também muitas vitórias e glória eterna.

E o seu talento, beleza e glamour estão congelados no tempo e por toda a eternidade. Hoje, 23 de março, se comemora o seu aniversário e se celebra esta mulher inesquecível como poucas. 

Um brinde à rainha de Hollywood!










Lucas Leigh, libriano de dezoito anos,
nasceu em 18 de outubro de 1994 e é ator.
Atualmente, estuda na Escola de Teatro NEELIC.
Pretendo fazer teatro e cinema aqui no Brasil
e quem sabe fora daqui. O que me atrai no cinema?
Bom, é a magia, algo grande e profundo demais
para se por em palavras.


Agradeço a existência de vocês por aqui.
Que Joan Crawford descanse em paz.



sábado, março 16, 2013

Possessed

Ela grita David e todos estão aos seus pés - neste tesouro da Warner Bros. de 1947.



Certamente que Joan Crawford nasceu para interpretar o papel da mulher descontrolada, uma enfermeira fiel a suas emoções que se chama Louise Howell. Ela deve ter cerca de trinta e poucos anos, e as numerosas tarefas na casa de Dean Graham ocupam todo seu tempo. Sem dúvida, Louise toma o pouco tempo que resta para amar. Amar o homem fatal David Sutton, interpretado brilhantemente por Van Heflin. Na casa de Dean Graham, Louise cuida da esposa inválida do patrão e, nas horas vagas, regozija-se da companhia do amado David. Como um autêntico veículo crawfordiesco, representante da Era de Ouro dos melodramas feitos pela Warner do pós-guerra, dos Women’s Pictures, POSSESSED coloca sua protagonista num turbilhão de emoções sem nunca evitar a construção de uma figura simpática.

Louise dada aos seus rompantes passionais.

A vida de Louise Howell se transforma completamente no seu dia de folga. A cuidadosa enfermeira se enfurece frente ao descaso de seu cético e matemático amante. Ao voltar arrasada para casa, ela recebe a notícia de que a mulher que estava aos seus cuidados faleceu enquanto ela discutia a relação com David. O mistério acerca da morte da senhora Graham gradativamente acarreta um transtorno psíquico na vida de Louise , seus sentimentos não correspondidos se tornam um fardo, a obsessão amorosa, argumento chave do filme.

                           O colapso de Louise ao ver David com outra mulher.

É louvado como uma peça essencial de filme Noir. O engomado termo francês veio caracterizar personagens problemáticos, relações amorosas doentias, criminalidade sob a ótica de uma realidade onírica e decadente. O chiaroscuro barroco e o expressionismo alemão mandam lembrança por meio dos planos embrigados de iluminação e contraste, em que surge um jogo entre ilusão e realidade que os fãs do gênero tanto amam. Da mesma forma que a feitura do Noir preza por uma estética tortuosa e potencializada, as interpretações carregam heranças acerca de uma teatralização explicitada, desde a pantomina do cinema mudo até a solidificação em si mesma de uma sensibilidade Camp, um aprendiz do Kitsch.


A cena inicial com Joan Crawford sem maquiagem, reza a lenda.

Admirado pelos estudiosos do gênero, POSSESSED chegou numa boa hora para sua estrela Joan Crawford que agradando seus fãs faz miséria de Louise. Sua interpretação traz um trabalho virtuoso de força e comoção. Há uma complexidade nos seus olhares que comunicam o sofrimento da personagem e em seu corpo rígido se transpõe sem muitos movimentos bruscos uma tensão proposta pela narrativa. A rigidez da sua atuação funciona como faca de dois gumes, por um lado nos simpatizamos com ela e por outro nos distanciamos dos seus absurdos. A perspectiva psicológica colocada pela câmera subjetiva e pelo formato de memórias em que se constrói a narrativa traz o efeito melancólico de um dos primeiros casos esquizofrênicos retratados pelo cinema.


Momento mui emblemático: DAVID! DAVID!

Parte do discurso psicanalítico no filme pode parecer demasiadamente sistemático. Todavia, o trabalho de mostrar ao espectador a dificuldade da protagonista em diferenciar realidade e ilusão por meio de linguagem cinematográfica triunfa em cima disso.

Vibramos cada vez que um colapso acomete Joan Crawford e podemos testemunhar de perto sua bravura ressonante.


Ver Também +


"Possessed: The Quintessential Film Noir" (2005)


Um documentário sobre a importância de "Possessed" para o cinema Noir.
[http://www.imdb.com/title/tt1003038/]



La Possédée

Elle vocifère David et tout le monde est à ses pieds - dans un tresór de Warner Bros. de 1947.


Bien sûr que Joan Crawford est née pour interpréter un rôle comme de la femme incontrôlée, une infirmière fidèle à ses émotions que s’appelle Louise Howell. Elle doit avoir quelques trente ans et les nombreuses tâches pour faire dans la maison de Dean Graham occupent tout son temps. Sans doute, Louise prend le peu de temps que reste à l’amour. L’amour à l’homme fatal David Sutton, interprété parfaitement pour Van Heflin. Dans la maison de Dean Graham, Louise soigne l’épouse invalide de son patron et quand il lui donne un jour de congé, elle se plaît de la compagnie d’amant David. Comme un authentique véhicule de Crawford, représentant de l’âge d’or de mélodrames par Warner d’après la guerre, de films de les femmes – « Women’s Pictures », LA POSSÉDÉE trouve sa protagoniste dans un tourbillon d’émotions sans éviter la construction d’un personnage sympathique.

"Porquoi?". David demande à Louise.

La vie de Louise Howell se transforme complètement durant un jour de congé. La méticuleuse infirmière s’irrite avec la négligence de son amant, un mathématicien très sceptique. Après retourner à la maison dévastée, elle reçoit la nouvelle de que son patient était mort alors que elle discutait la relation avec David. Le mystère de la mort de madame Graham va causer peu à peu un trouble psychiatrique à la vie de Louise, ses sentiments deviennent un fardeau, l’obsession amoureuse est le principal argument du film.

Louise cherche David en étrangers dans la rue.

Il est louangé comme une pièce essentielle du film noir, au cinéma américain des années 40. L’élégant et gâté terme [film-noir] a été inventé par un critique français dans le but de caractériser personnages problématiques, les relations amoureuses conflictuelles, la criminalité d’un point de vue onirique et décadent. Le baroque clair-obscur et l’expressionnisme allemand nous envoient de souvenir à travers des plans soûls d’illumination et de contraste. Où on a un jeu entre l’illusion et la réalité que les fans du genre aiment tant. Comme la production du Noir apprécie son esthétique tortueuses et puissante, l’interprétations prennent un héritage de théâtralité plus explicite de la pantomime du cinéma muet à la solidification d’une sensibilité Camp, l’apprenti du Kitsch.

Louise ne sait pas quoi faire quand voit David avec autre femme.

Admiré par les chercheurs du genre, LA POSSÉDÉE est arrivé dans un bon moment pour Joan Crawford que plaît ses fans avec un tour de force. Son interprétation combine un travail virtuose de force et commotion. Il y a une complexité dans ses yeux que communiquent la souffrance de Louise et son corps rigide, sans mouvements brusques, révèle une tension proposée par l’histoire. La rigidité de sa performance ambigüe fonctionne d’une part qu’on sympathise avec elle, mais d’autre part on distance de ses absurdités. La perspective psychologique donnée par la caméra subjective et par le format de conter avec mémoire crient un effet mélancolique pour un de les premiers cas schizophrène représenté dans le cinéma.

Louise parle avec le docteur de ses mémoires.

Part du discours psychanalytiche peut se présenter trop systématique. Toutefois, le travail de présenter au spectateur la difficulté de Louise triomphe. À partir de la langage cinématographique, quand elle a besoin de différencier l’illusion et la réalité, son moment de catharsis se construit aussi à travers d’une esthétique unique. On vibre à chaque fois qu’une folie attaque Joan Crawford et on peut témoigner près d’elle sa bravoure résonnante.

Joan Crawford, la reine chez le monde du film noir.


Voir aussi +

"La Possédée: Le Film Noir Quintessentiel" (2005)


Un documentaire sur l'importance de "La Possédée" au genre de les films Noir.