sábado, março 16, 2013

Possessed

Ela grita David e todos estão aos seus pés - neste tesouro da Warner Bros. de 1947.



Certamente que Joan Crawford nasceu para interpretar o papel da mulher descontrolada, uma enfermeira fiel a suas emoções que se chama Louise Howell. Ela deve ter cerca de trinta e poucos anos, e as numerosas tarefas na casa de Dean Graham ocupam todo seu tempo. Sem dúvida, Louise toma o pouco tempo que resta para amar. Amar o homem fatal David Sutton, interpretado brilhantemente por Van Heflin. Na casa de Dean Graham, Louise cuida da esposa inválida do patrão e, nas horas vagas, regozija-se da companhia do amado David. Como um autêntico veículo crawfordiesco, representante da Era de Ouro dos melodramas feitos pela Warner do pós-guerra, dos Women’s Pictures, POSSESSED coloca sua protagonista num turbilhão de emoções sem nunca evitar a construção de uma figura simpática.

Louise dada aos seus rompantes passionais.

A vida de Louise Howell se transforma completamente no seu dia de folga. A cuidadosa enfermeira se enfurece frente ao descaso de seu cético e matemático amante. Ao voltar arrasada para casa, ela recebe a notícia de que a mulher que estava aos seus cuidados faleceu enquanto ela discutia a relação com David. O mistério acerca da morte da senhora Graham gradativamente acarreta um transtorno psíquico na vida de Louise , seus sentimentos não correspondidos se tornam um fardo, a obsessão amorosa, argumento chave do filme.

                           O colapso de Louise ao ver David com outra mulher.

É louvado como uma peça essencial de filme Noir. O engomado termo francês veio caracterizar personagens problemáticos, relações amorosas doentias, criminalidade sob a ótica de uma realidade onírica e decadente. O chiaroscuro barroco e o expressionismo alemão mandam lembrança por meio dos planos embrigados de iluminação e contraste, em que surge um jogo entre ilusão e realidade que os fãs do gênero tanto amam. Da mesma forma que a feitura do Noir preza por uma estética tortuosa e potencializada, as interpretações carregam heranças acerca de uma teatralização explicitada, desde a pantomina do cinema mudo até a solidificação em si mesma de uma sensibilidade Camp, um aprendiz do Kitsch.


A cena inicial com Joan Crawford sem maquiagem, reza a lenda.

Admirado pelos estudiosos do gênero, POSSESSED chegou numa boa hora para sua estrela Joan Crawford que agradando seus fãs faz miséria de Louise. Sua interpretação traz um trabalho virtuoso de força e comoção. Há uma complexidade nos seus olhares que comunicam o sofrimento da personagem e em seu corpo rígido se transpõe sem muitos movimentos bruscos uma tensão proposta pela narrativa. A rigidez da sua atuação funciona como faca de dois gumes, por um lado nos simpatizamos com ela e por outro nos distanciamos dos seus absurdos. A perspectiva psicológica colocada pela câmera subjetiva e pelo formato de memórias em que se constrói a narrativa traz o efeito melancólico de um dos primeiros casos esquizofrênicos retratados pelo cinema.


Momento mui emblemático: DAVID! DAVID!

Parte do discurso psicanalítico no filme pode parecer demasiadamente sistemático. Todavia, o trabalho de mostrar ao espectador a dificuldade da protagonista em diferenciar realidade e ilusão por meio de linguagem cinematográfica triunfa em cima disso.

Vibramos cada vez que um colapso acomete Joan Crawford e podemos testemunhar de perto sua bravura ressonante.


Ver Também +


"Possessed: The Quintessential Film Noir" (2005)


Um documentário sobre a importância de "Possessed" para o cinema Noir.
[http://www.imdb.com/title/tt1003038/]



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